O mais humano dos homens


Por muito tempo eu entendia Jesus como alguém extraordinário. Sim, ele era e é, mas não dessa maneira que eu entendia. No sentido literal, extraordinário é algo fora do ordinário. Fora do comum, uma exceção à regra. Com certeza Jesus não foi alguém comum, era um contraste para tudo que conhecemos. Mas permita-me explicar o que era o Jesus tão extraordinário em minha visão.
Começava com a ideia de que Ele era Deus, e que Deus estava ali andando pelas ruas de Jerusalém, e mesmo sendo gente, Ele tinha todo o poder da divindade – e eu ainda acredito em tudo isto, o desdobramento dessas ideias é que me eram desgastantes.
Então pensava eu assim, e logo imaginei que este Deus encarnado só podia fazer as coisas que fazia porque era Deus, e o que o homem não faz nada do que Ele faz. Ele é Deus. Que dizer, Ele pode fazer tudo que eu jamais poderia fazer pois eu nunca seria um deus. Ele podia falar como falava e agir como agia porque não havia nEle nada humano. Era Deus e ponto.
Ele estava tão distante de mim, era um modelo inalcançável. Tudo a respeito dEle era divino, suas motivações, emoções, pensamentos. E Aquele Deus me convidava a segui-lo, e a ser como Ele, e a aprender dEle. Ora, é uma honra, não? Se um Deus te chama a chegar mais perto você não vai? Mas se achegar como? Eu perguntava. Ele é Deus, impossível um mortal como eu me achegar a um Deus e ainda mais, ser como Ele.
A não ser que eu pudesse admitir a ideia da possibilidade de ser um deus também. Então era isso, Ele veio até nós para fazer todos deuses como Ele é. E como um deus é? Justo? Puro? Santo? E na tentativa de adquirir estes atributos me aventurei nas maiores charlatanices e mesquinharias, canalhice de ultimo grau que envolviam regras e modelos de conduta. Tudo para ser como Ele. Para ser como um brilhante e inefável deus. Um santo. Um justo juíz.
E quanto mais eu seguia neste pensamento, mais distante eu estava daquele Deus. Pois mal sabia eu que aquele Deus encarnado, andando e comendo com pecadores estava sendo interpretado da pior maneira possível por patifes como eu. Mal sabia eu que Jesus, sendo Deus, era também chamado como Filho do Homem.
Mal sabia eu que Jesus, sendo Deus, foi também o filho da dona Maria e do seu José, e que tinha uma trupe de doze companheiros com quem ele falava a respeito de um Reino onde todos os homens são iguais e que não haverá deuses neste Reino, nem templos para eles, e que neste Reino tem um Pai. Sim, um Pai. Que olha por todos, porque só Ele é bom, e todos os outros são meros humanos. Mal sabia eu que Jesus não se importava muito se certa mulher era judia ou samaritana, ele apenas queria um copo de água para matar a sede, pois o sol estava quente. Eu pouco me importava se Jesus era carpinteiro e tinha a testa queimada pelo sol e as mãos cheias de calo. Quem ligava se Jesus tirava uma soneca de vez em quando no barco durante a viagem? Eu estava muito mal informado a respeito daquele homem que tocava, e tocava mesmo, nos mendigos, cegos e leprosos. Eu deixava de lado as lágrimas amarguradas de alguém que carregava sobre as costas a missão de redimir o mundo inteiro. E que se sentia sozinho e traído.
Jesus é Deus que experimentou tudo, da sede à dor. Até mesmo a morte. Jesus foi o homem, que também é Deus, mas que fez o caminho inverso daquilo que eu pensava ser a respeito dele. Deus deixou de ser deus para ser gente, e nos convidou a segui-lo, a aprender dele como era deixar de ser deus para ser gente. Eis aí uma poderosa mensagem de Cristo, me ensinar a deixar de ser deus para abraçar a minha própria humanidade. E só então poderei conceber o que significa a palavra Pai. Só então poderei entender que só Deus é bom. Poderei enfrentar minhas fraquezas e dificuldades da forma mais humana possível. E que agora posso caminhar para encontrar este Cristo humano, e também Deus, que não pede de mim nada mais do que eu posso ser: gente.
De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, que, sendo em forma de Deus, não teve por usurpação ser igual a Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, tomando a forma de servo, fazendo-se semelhante aos homens.”
(Filipenses 2:5-7)
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Fonte:GeraçãoRenovada

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